segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Nutricionistas da UFV criam produtos alimentícios à base de algas marinhas visando o desenvolvimento social de comunidades costeiras como Rio do Fogo

A pesquisa acaba de conquistar o primeiro lugar na área de Nutrição em Saúde Pública e o segundo lugar na área de Ciência e Tecnologia de Alimentos (Categoria I), do Prêmio Henri Nestlé.

De Minas Gerais, mais precisamente da cidade de Viçosa, saiu a solução para o desenvolvimento e sustentabilidade das comunidades costeiras de Rio do Fogo, no Rio Grande do Norte e Pedrinhas, no Ceará. Apesar de não ter mar, por aqui se tem o conhecimento e a tecnologia necessários para transformar algas marinhas em produtos alimentícios. Uma equipe do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Nutrição da UFV, liderada pela professora Ana Vládia Bandeira Moreira, se dedicou a estudar as algas Gracilaria birdiae e a partir delas desenvolveu receitas que valorizam os alimentos do litoral e enriquecem a culinária da região.

Sorvete de  morango, salada fantasia, gelatina de cajá, pão de cebola recheado, bolo de arroz com calda de maracujá, manjar, bobó de algas, panquecas, sobremesa refrescante e nhoque da sorte. Tudo feito à base de algas marinhas. O cardápio de dar água na boca foi desenvolvido para atender às comunidades litorâneas e, sobretudo, foi elaborado com a participação direta das maricultoras, que são trabalhadoras que se dedicam ao cultivo e beneficiamento de espécies marinhas.

De acordo com a professora Ana Vládia, algas marinhas têm alto valor nutritivo, sendo ricas em carotenóides, proteínas, fibras dietéticas, ácidos graxos essenciais, vitaminas e minerais. O litoral brasileiro é um dos principais produtores de algas no mundo. Contudo, o consumo de algas como alimento ainda é pequeno no Brasil. Ao passo que em países asiáticos como Japão, China e Coréia do Sul, as algas chegam a constituir 25% da dieta humana.

Nas comunidades de Rio do Fogo e Pedrinhas existem muitos bancos naturais de algas. A princípio, o extrativismo era feito a partir dos bancos naturais, com a finalidade de vender algas para extração do ágar-ágar, um dos seus principais componentes. O ágar-ágar é uma substância muito utilizada pela indústria farmacêutica e alimentícia. Além de não ser lucrativa para as maricultoras, devido à baixa remuneração obtida com a venda das algas, a atividade estava destruindo os bancos naturais e provocando um desequilíbrio ambiental. Diante disso, por intervenção da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação – FAO, as maricultoras do litoral nordestino passaram a cultivar algas em balsas.

Algas em sua mesa

Com o cultivo eficiente das algas, era preciso dar vazão à produção. E foi com essa finalidade que em 2008, a professora Ana Vládia e sua equipe assumiram o projeto “Algas em sua mesa”. Primeiro, foi realizada a caracterização química das algas submetidas ao processamento de secagem local e secagem em laboratório. A mestranda Camila Gonçalves Oliveira Chagas participa da pesquisa desde o início. Ela afirma que “o projeto trabalha várias vertentes: desenvolvimento da pesquisa científica, boas práticas de manipulação, educação nutricional, cuidados com o cultivo e desenvolvimento e aplicação de tecnologia social”.

Camila conta que a princípio teve muitos questionamentos por pesquisar algo tão distante do seu cotidiano. Mas o contato direto com as maricultoras foi fundamental para responder a uma série de questões e dar sentido às pesquisas. A equipe da UFV realiza visitas regulares às comunidades. A mestranda descreve: “Aqui em Minas, na nossa cultura alimentar, não consumimos algas. A gente sabe que se utiliza algum tipo em comida japonesa. Mas ao conhecer as comunidades, vimos que as respostas de laboratório tinham aplicação. Fazemos análise e pesquisa aplicada em interface com a comunidade e seus interesses”.

As pesquisadoras da UFV desenvolveram doze receitas e ofereceram oficinas nas comunidades para compartilhar a tecnologia. Agora, as maricultoras cultivam, colhem, processam essa alga e preparam os alimentos. Além de incrementar de forma nutritiva a dieta alimentar, as receitas à base de algas estão gerando renda para as comunidades que passaram a comercializar os produtos.

De acordo com a professora Ana Vládia é gratificante ver como as maricultoras estão se apropriando da tecnologia desenvolvida na universidade. Além disso, por ter uma ampla abordagem, o projeto vem aglutinando outras linhas de pesquisa como a parte de antioxidantes e produção de alimentos sem glúten, que é uma tendência de mercado e que já foi repassada às comunidades. “A história de cada uma daquelas mulheres é encantadora. É gratificante viver o ensino aplicado. É  possível vivenciar aulas, pesquisa e extensão, todas juntas” – conclui a pesquisadora da UFV.

Iniciado nos  municípios de Rio do Fogo (RN) e Itapipoca (CE), o projeto “Algas em sua mesa” já chegou a mais um estado. A experiência com algas alimentares foi levada para a comunidade de Pitiumbu, no estado da Paraíba, que já possui uma cooperativa estruturada com potencial para compartilhar os produtos desenvolvidos. A pesquisa da UFV integra uma iniciativa maior: o projeto “Desenvolvimento de Comunidades Costeiras (DCC)”, que é fruto de uma parceria entre o Ministério da Pesca e Aquicultura e a FAO, com o objetivo de capacitar pescadores e maricultores artesanais.


PPG

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