Na Copa, proteção será ampliada

Os preparativos para a Copa do Mundo 2014, que ocorrerá a pouco mais de duas semanas no país e tem Natal como uma das cidades-sede, mudam a estrutura e o funcionamento tradicional de diversos órgãos do poder público com vistas a reforçar a segurança e ampliar a prevenção à violência infantil e infração dos direitos da criança e do adolescente. O Comitê Local em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente na Copa Fifa 2014, formado por diversos órgãos públicos, discute ações para coibir esses tipos de agressões. A expectativa é que esse seja um “legado da Copa” e a atuação continue após o evento esportivo.

Dentre as medidas que serão adotadas estão uma base móvel da Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA) na área da Fifa Fan Fest e intensificação das fiscalizações sobre violações do Estatuto da Criança e do Adolescente que chegarem ao órgãos competentes durante a Copa. Mas, até lá, órgãos e programas de apoio aos menores que tiveram seus direitos infringidos seguem com suas estruturas deficientes e, consequentemente, têm o atendimento prejudicado.

A DCA é a única divisão policial que atende todos os casos envolvendo crianças e adolescentes do Rio Grande do Norte. A equipe formada por um delegado, um escrivão, sete agentes e duas viaturas cobre o Estado. Devido a esse número reduzido, o titular da unidade policial, Reginaldo Pereira Soares, afirma que é dada prioridade aos casos de Natal e Região Metropolitana, enquanto os do interior “são averiguados e, dependendo da gravidade, são acionadas as delegacias desses municípios para contribuir”. Segundo Reginaldo Soares, no ano passado foram concluídos 121 inquéritos e, atualmente, estão em andamento outros 80.

Mais um serviço de atendimento a esses casos contra crianças e adolescentes, o programa SOS Criança Natal, em Cidade da Esperança, carece de pessoal e infraestrutura, mesmo sendo um serviço que, como destacou Dilma Felizardo, atuante contra a exploração sexual infantil há 25 anos, “histórico no atendimento ao público infantil, antes das redes de proteção e conselhos tutelares serem criados”. 

Na fachada falta qualquer sinal de que lá funciona um ponto de assistência à população e que tem demanda de 15 a 20 denúncias diárias. São inscrições na placa de endereço da rua que indicam a base do programa, criado em 1990 e vinculado à Fundação Estadual da Criança e do Adolescente (Fundac). As instalações estão prejudicadas e o local não tem qualquer tipo de segurança. 

Durante o expediente, que funciona 24 horas, o máximo de funcionários chega a nove - a coordenadora, um cozinheiro, uma pessoa da limpeza, de três a quatro educadores, um motorista e uma secretária. Mas, à noite, quando segundo a coordenadora Genilda Araújo é o momento mais importante para atuação do programa, apenas dois educadores dividem o espaço e sem visitas domiciliares, já que não há motorista neste turno e o déficit é de pelo menos sete educadores para o funcionamento ideal. 

Também participando do Comitê, a Secretaria Municipal do Trabalho e Assistência Social (Semtas) é outro órgão que terá funcionamento extraordinário no período da Copa do Mundo, com dois serviços – plantão integrado e espaço de convivência – além da tradicional busca ativa. Apesar dos reforços anunciados, nem a divisão da Polícia Civil nem a secretaria municipal especificaram de que forma essa intensificação se dará em relação ao pessoal a ser empregado.

Ações de combate ao trabalho infantil serão intensificadas 

Participante do Comitê Local em Defesa da Criança e do Adolescente na Copa, a auditora fiscal e coordenadora do Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Estado (SRTE/RN), Marinalva Dantas afirma que o órgão fará plantões de fiscalização para verificar as denúncias de exploração do trabalho infantil durante a Copa do Mundo em Natal. Quando constatada infração, inclusive por exploração sexual, haverá autuação e, se necessário, submeter o responsável a processo criminal.

“O reconhecimento da prostituição como profissão também exige fiscalização. Além disso, é considerada pela OIT [Organização Internacional do Trabalho] uma das piores formas de trabalho infantil”, disse. Ela conta que a demanda deverá ser maior nas praias do RN e, por isso, fiscalização se concentrará nessas áreas. Com a integração dos órgãos atuantes contra violação dos direitos da criança e do adolescente, será montada uma base na Fifa Fan Fest para acolher menores encontrados em trabalho infantil. No local serão identificados e depois entregue aos pais ou responsáveis.

“Censo do IBGE de 2012 diz que, só na Grande Natal, existiam 8 mil, crianças em trabalho infantil. Mas, há também os que normalmente vêm de outras cidades e estados vizinhos para trabalharem em grandes eventos. Então imagine na Copa”. Para evitar esses casos, Marinalva Dantas diz que também haverá articulação com polícias rodoviárias.

Ela acrescenta que o percurso Fortaleza-Recife, indo de uma cidade-sede a outra e passando por Natal, deverá ter grande movimentação de estrangeiros nas rodovias e “cafetões e agenciadores devem atuar fortemente”. A coordenadora do Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil diz não saber se estará preparada para a alta demanda num tempo curto. Segundo ela, colegas de cidades que tiveram jogos da Copa das Confederações em 2013 relataram grande crescimento de casos. Em Natal serão oito fiscais da SRTE/RN atuando durante a Copa do Mundo.

Manoel Onofre Neto, também do Comitê, frisa que “a preocupação é que os direcionamentos sejam tomados devidamente e que não haja surpresa para articular os órgãos envolvidos”. Segundo ele, as fiscalizações do Ministério Público junto à Polícia Civil, à Defensoria Pública e Conselhos Tutelares vão observar condutas e possíveis irregularidades envolvendo menores de idade. Na próxima terça-feira (27), segundo o procurador, haverá uma das últimas reuniões do Comitê, fechando os últimos detalhes para essa atuação durante a Copa em Natal.

Servidores são preparados para atuar na Copa

A Rede de Proteção da Criança e do Adolescente reúne diversos órgãos públicos que atuam na proteção dessa parcela da população e, para atuar durante a Copa do Mundo em Natal, um curso de formação foi aplicado a psicólogos, assistentes sociais, professores, comunicadores entre outras profissões atuantes em órgãos como Tribunal de Justiça, Ministério Público e Ministério Público do Trabalho. 

Os participantes foram selecionados para assistir ao Curso de Capacitação na área de exploração sexual contra crianças e adolescentes, do Instituto Brasileiro de Estudos, Pesquisas e Formação para a Inovação Social (Ibepis), considerando a importância e atuação do local de trabalho daqueles que se inscreveram.

Presidente do instituto e responsável pelas aulas, Dilma Felizardo destaca a importância da preparação desses servidores para lidar com os casos com a devida propriedade e orientação ideal. “Natal tem buscado ações, de diversos setores da sociedade para garantir proteção e defesa da criança e do adolescente durante a Copa”, afirmou.

O curso, parceria entre o Ibepis, a DKA-Áustria, o selo Copa Legal (iniciativa da Frente Parlamentar Estadual da Criança e do Adolescente) e o Instituto do Legislativo Potiguar (ILP) tem aulas até o próximo dia 30. Um dia antes, participantes vão à apresentação das ações que serão feitas pelo Comitê Local em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente na Copa Fifa 2014, na Frente Parlamentar Municipal.

Tribuna do Norte